quinta-feira, 5 de novembro de 2015

2.


Se todos conheciam Alves através dos curtos momentos nos escassos espaços, Alves se conhecia e reconhecia o tempo todo pelos enormes locais que construía, universos inteiros populados por outros Alves que eram o próprio Alves, dividido em suas múltiplas personalidades. Alves não era pequeno nem escasso. Era grande e transbordava. Tinha emoções e costumava expressá-las. Mas não nos escassos espaços. Nos escassos espaços era monoemotivo. Era cru e não se fazia ouvir. Porque se o ouvissem, não o entenderiam. A capacidade de Alves para interagir com as pessoas da forma como gostaria era muito menor que o quarto, a mesa, os buracos, os membros, o cuidado com os papeis ou os amassos nas camisas. A paciência de Alves também era escassa. E assim, Alves vivia: com metade de sua vida o incomodando no bolso de trás da calça, e a outra dividida em diálogos rasos, relacionamentos vazios, trabalhos inconclusos, papeis amassados, roupas sujas, escassos espaços e a imensidão de sua cabeça sempre crescendo e o engolindo.

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